Quase um ano após a minha chegada a este país dou por mim a reflectir como foi possível sobreviver nesta terra estranha que nem sempre é a mais simpática para com forasteiros. No meio de todo este carrossel de imagens e sons pego no papel, numa caneta e escrevo, escrevo o meu manual de sobrevivência, o manual do contrabandista da alegria…
Existem pessoas que viveram vidas fantásticas, cheias de histórias para contar. Histórias que inspiram e nos fazem sonhar, que nos fazem acreditar que existe mais para além do que sabemos e damos como adquirido. Nunca conheci nenhuma dessas pessoas pessoalmente mas sempre fizeram parte da minha vida. Li viagens de Custeau até aos abismos do universo marítimo, estudei as jornadas de Darwin no Beagle através das Galápagos e bebi inspiração nos nossos antepassados, Álvares Cabral, Camões, Pessoa e tantos outros. Todos eles viveram vidas que mereceram ser contadas, toda a informação que injectava solenemente na minha corrente de conhecimento ia fazendo com que o desejo de partir fosse cada vez maior.
Então no dia 13 de Setembro de 2006 parti.
De certo que a minha vida não terá tanto para contar como a vida dos heróis que alimentaram o meu imaginário. De certo que o que vou atingir não será de modo algum comparável aos feitos dos exploradores que se aventuraram no desconhecido, no entanto, tanto eu como eles partilhamos algo em comum, todos tivemos de aprender a sobreviver em ambientes que nos eram desconhecidos, incompreensíveis e por vezes hostis. Cedo aprendi que apenas temos três maneiras de sobreviver neste País, no entanto, apenas uma nos permite viver de forma plena e em paz com a nossa pessoa.
Podemos começar por recusar tudo o que este país nos oferece, acreditem ou não esta é uma maneira de sobreviver. Tentamos manter o que trouxemos de Portugal, recusamos a cultura do País, as gentes, os costumes. Focamo-nos no trabalho e vemos a nossa estadia aqui como um passo intermédio para algo, uma fase, uma cedência temporária antes de regressar a Portugal. Deste modo sobrevivemos, só que sobrevivemos de um modo triste e solitário. Ao recusar o povo recusamos os seus defeitos mas também recusamos as suas virtudes, a recusa leva ao isolamento e regressamos ao nosso pais não muito mais ricos interiormente do que quando partimos.
Outra opção é fazer precisamente o contrário, ou seja, rendermo-nos a este País, aceitar as suas características e hábitos, viver como um alemão. Esta opção também garante a sobrevivência e levamos uma existência mais alegre que na opção anterior. No entanto, se é verdade que enriquecemos o nosso ser, também não é menos verdade que nos arriscamos a perder identidade, uma identidade que está albergada em nós desde tempos imemoriais, uma identidade que alguém dificilmente conseguirá expor em palavras, a identidade Portuguesa. Não me refiro a simples aspectos como língua e costumes, falo de uma maneira de estar e ser, uma maneira que este povo não tem nem terá.
Esta também não é a opção correcta de sobrevivência, não nos podemos subjugar a eles, nem aceitar de bom grado tudo o que nos dizem, assim, depois de alguma reflexão decidi que a melhor maneira de sobreviver é ser um contrabandista, e como qualquer contrabandista que se preze temos de ter algo para contrabandear, foi assim que me decidi tornar no contrabandista da alegria…
O conceito é simples, como sou contrabandista não conheço fronteiras. Posso alternar mentalmente entre Portugal e Alemanha sem pedir justificações, ora sou Alemão quando mais me convém, ora sou Português quando não os quero aturar nem ver à frente. Como bom contrabandista que sou tenho amigos em ambos os lados da fronteira, tenho os meus locais de refúgio onde me escondo, tenho os meus caminhos secretos. Como sou um fora da lei tenho a liberdade de fazer coisas que os outros não podem, critico à vontade a sociedade Alemã e encho-me de rir com as teorias de conspiração de alguns nativos. Mas um contrabandista também é conhecido por ser fiel às suas origens, fiel ao sítio que o viu nascer e crescer. Pode percorrer vários países, contactar com várias gentes, mas regressa sempre a sua casa.
Desde que cheguei ao instituto que consegui mudar alguns hábitos no grupo de trabalho, o ambiente é agora muito mais descontraído. Na semana passada até tive uma agradável surpresa quando uma simpática senhora do departamento me disse que vai ter saudades quando eu abandonar o PIK pois enche-se de rir sempre que eu conto mais uma história bizarra que me acontece.
Como disse uma vez um general Português, podemos derrotar um exército, mas não podemos derrotar um povo. Não os podemos derrotar nem nos devemos juntar a eles, devemos, isso sim, alternar no melhor que os dois povos nos têm para dar. Ser contrabandista da alegria é a opção correcta de sobrevivência para com um povo que nos sabe receber e aceitar, mas que em nada se assemelha ao nosso no momento solene de esboçar um sorriso.
Da Alemanha com saudades…
Luís, o contrabandista…
Então no dia 13 de Setembro de 2006 parti.
De certo que a minha vida não terá tanto para contar como a vida dos heróis que alimentaram o meu imaginário. De certo que o que vou atingir não será de modo algum comparável aos feitos dos exploradores que se aventuraram no desconhecido, no entanto, tanto eu como eles partilhamos algo em comum, todos tivemos de aprender a sobreviver em ambientes que nos eram desconhecidos, incompreensíveis e por vezes hostis. Cedo aprendi que apenas temos três maneiras de sobreviver neste País, no entanto, apenas uma nos permite viver de forma plena e em paz com a nossa pessoa.
Podemos começar por recusar tudo o que este país nos oferece, acreditem ou não esta é uma maneira de sobreviver. Tentamos manter o que trouxemos de Portugal, recusamos a cultura do País, as gentes, os costumes. Focamo-nos no trabalho e vemos a nossa estadia aqui como um passo intermédio para algo, uma fase, uma cedência temporária antes de regressar a Portugal. Deste modo sobrevivemos, só que sobrevivemos de um modo triste e solitário. Ao recusar o povo recusamos os seus defeitos mas também recusamos as suas virtudes, a recusa leva ao isolamento e regressamos ao nosso pais não muito mais ricos interiormente do que quando partimos.
Outra opção é fazer precisamente o contrário, ou seja, rendermo-nos a este País, aceitar as suas características e hábitos, viver como um alemão. Esta opção também garante a sobrevivência e levamos uma existência mais alegre que na opção anterior. No entanto, se é verdade que enriquecemos o nosso ser, também não é menos verdade que nos arriscamos a perder identidade, uma identidade que está albergada em nós desde tempos imemoriais, uma identidade que alguém dificilmente conseguirá expor em palavras, a identidade Portuguesa. Não me refiro a simples aspectos como língua e costumes, falo de uma maneira de estar e ser, uma maneira que este povo não tem nem terá.
Esta também não é a opção correcta de sobrevivência, não nos podemos subjugar a eles, nem aceitar de bom grado tudo o que nos dizem, assim, depois de alguma reflexão decidi que a melhor maneira de sobreviver é ser um contrabandista, e como qualquer contrabandista que se preze temos de ter algo para contrabandear, foi assim que me decidi tornar no contrabandista da alegria…
O conceito é simples, como sou contrabandista não conheço fronteiras. Posso alternar mentalmente entre Portugal e Alemanha sem pedir justificações, ora sou Alemão quando mais me convém, ora sou Português quando não os quero aturar nem ver à frente. Como bom contrabandista que sou tenho amigos em ambos os lados da fronteira, tenho os meus locais de refúgio onde me escondo, tenho os meus caminhos secretos. Como sou um fora da lei tenho a liberdade de fazer coisas que os outros não podem, critico à vontade a sociedade Alemã e encho-me de rir com as teorias de conspiração de alguns nativos. Mas um contrabandista também é conhecido por ser fiel às suas origens, fiel ao sítio que o viu nascer e crescer. Pode percorrer vários países, contactar com várias gentes, mas regressa sempre a sua casa.
Desde que cheguei ao instituto que consegui mudar alguns hábitos no grupo de trabalho, o ambiente é agora muito mais descontraído. Na semana passada até tive uma agradável surpresa quando uma simpática senhora do departamento me disse que vai ter saudades quando eu abandonar o PIK pois enche-se de rir sempre que eu conto mais uma história bizarra que me acontece.
Como disse uma vez um general Português, podemos derrotar um exército, mas não podemos derrotar um povo. Não os podemos derrotar nem nos devemos juntar a eles, devemos, isso sim, alternar no melhor que os dois povos nos têm para dar. Ser contrabandista da alegria é a opção correcta de sobrevivência para com um povo que nos sabe receber e aceitar, mas que em nada se assemelha ao nosso no momento solene de esboçar um sorriso.
Da Alemanha com saudades…
Luís, o contrabandista…
2 comentários:
E já dizia o outro "Em Roma se Romano"....
Amigo, revejo-me em 100% nesta tua postagem... Eu sou um dakeles que me juntei a ti na aventura de conhecer novas pessoas, novas realidades... enfim algo que nos fizesse crecer não so no nivel pessoal mas, principalmente, ao nível profissional! De certo modo encarei a minha vinda para York como algo passageiro e por isso os primeiros tempos foram dolorosos... Mas como referiste e bem, tornei-m um pouco ingles nunca perdendo a minha identidade (Macho latino!!!) portuguesa e agora eh tudo mais fácil pois "se os podes vencer, junta-te a eles"! espero k o teu regresso as origens dentro de pouco tempo te dê forxa para, quem sabe, poderes conquistar algo de mais importante na tua estadia pela alemanha! abraxo
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